LABORATÓRIO QUÍMICO DO MUSEU IMPERIAL E NACIONAL

De Dicionário Histórico-Biográfico das Ciências da Saúde no Brasil (1832-1970)
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Denominações: Laboratório Químico do Museu Imperial e Nacional (1824)

Resumo: O Laboratório Químico do Museu Imperial e Nacional foi criado em dezembro de 1824, por iniciativa do diretor do Museu, João da Silveira Caldeira. Foi instalado no andar de baixo do referido Museu, situado no Campo de Santana, na cidade do Rio de Janeiro. Realizou as primeiras análises de combustíveis nacionais e de amostras de pau-brasil, e posteriormente, também, as primeiras perícias toxicológicas do país. Em 1911, já estando instalado o Museu no antigo Palácio Imperial da Quinta da Boa Vista, o Laboratório foi desdobrado em "Laboratório de Química Analítica" e "Laboratório de Química Vegetal", fundindo-se novamente em Laboratório de Química, em 1916. Em março de 1931, o Departamento de Química do Museu foi extinto.

Histórico

Com a vinda da Corte portuguesa para o Brasil (1808) e o movimento intenso de naturalistas que aqui chegaram, houve por todo o país, mais acentuadamente na cidade do Rio de Janeiro, uma valorização dos estudos de história natural enfatizando o seu caráter prático. Neste ambiente, foi criado, em 6 de junho de 1818, o Museu Real, a primeira instituição brasileira dedicada exclusivamente ao estudo das ciências naturais. O Museu, instalado inicialmente no Campo de Santana, teve como seu primeiro diretor o franciscano Frei José Batista da Costa Azevedo (1818-1822), que havia freqüentado o curso de Ciências Naturais na Universidade de Coimbra, destacando-se em mineralogia.  Entretanto, foi na gestão de seu sucessor, João da Silveira Caldeira (1823-1827), que foi instalado no andar de baixo do então denominado Museu Imperial e Nacional, em 1824, o Laboratório Químico. Segue-se o texto da Decisão nº206, de 15 de dezembro de 1824, que criou o Laboratório:

“Manda S.M. o imperador, pela secretaria de estado dos negócios do império, participar ao diretor do Museu Nacional que lhe foi presente o seu ofício de 9 de novembro próximo passado, no qual mostra as vantagens práticas que possam resultar à Nação de estabelecimento de um laboratório químico nesta corte, e o local mais próprio para o seu assentamento, ajuntando uma lista de aparelhos e instrumentos necessários para o fim proposto; e o mesmo Augusto Senhor havendo dado nesta data as suas imperiais ordens para se mandar pela repartição dos negócios estrangeiros, proceder à compra dos mencionados instrumentos, tem resolvido que o edifício do laboratório se faça no mesmo terreno do museu, por baixo dos novos salões que se estão fazendo, como já foi proposto pelo mencionado diretor. Palácio do Rio de Janeiro, em 15 de dezembro de 1824. – Estevão Ribeiro de Resende” (Apud AZEVEDO, 1994, p. 26).

João da Silveira Caldeira foi o grande responsável pela idealização e instalação do Laboratório, e seu primeiro diretor (27/10/1823-1827). Doutor em medicina pela Universidade de Edimburgo e hábil químico, já aos 19 anos fez estágio em Paris com renomados químicos como Louis Nicolas Vauquelin (1763-1829) e André Laugier (1770-1832), e também com o mineralogista René Just Haüy (1743-1822). Silveira Caldeira publicou, em 1825, a “Nova Nomenclatura Química Portuguesa”, um dos primeiros compêndios de assuntos químicos escrito no Brasil.

O Laboratório Químico do Museu Imperial e Nacional foi, na opinião de Alfredo Andrade (1949), o primeiro laboratório químico para análises a ser fundado no país, pois o Laboratório Químico-Prático, criado em 1812, destinava-se fundamentalmente a exames de produtos farmacêuticos.  
Depois de devidamente aparelhado, passaram a ser realizadas no Laboratório Químico as primeiras análises de combustíveis nacionais e de amostras de pau-brasil. 

Ladislau de Souza Mello Netto, diretor (interino, de 1870 a 1875, e efetivo de 1875 a 1892), do Museu Imperial e Nacional, em sua obra “Investigações históricas e scientificas sobre o Museu Imperial e Nacional do Rio de Janeiro”, publicada em 1870, destacou a criação do laboratório:

“Havia-se creado, justamente pouco antes, em Dezembro de 1824, por baixo do salão ocupado actualmente pela Secção de Botanica, um laboratório chimico e physico, convenientemente preparado para as analyses e experiencias de que houvesse mister o estabelecimento, e com este sdous notáveis e importantes melhoramentos recebeu o digno diretor um vasto e rico pascigo para suas sabias lucubrações”. (LADISLÁU NETTO, 1870, p.38)

Em outro trecho de sua obra, Mello Netto recordou o decreto imperial, de 10 de abril de 1830, segundo o qual, tendo em vista a aprovação da proposta da Sociedade Auxiliadora da Industria Nacional sobre o estabelecimento de escolas normais de diferentes disciplinas, estas escolas deveriam funcionar nas casa por baixo do Museu Imperial e Nacional, e que os lentes de química e física deveriam proferir suas aulas no laboratório do Museu, utilizando-se dos instrumentos que fossem convenientes aos estudos (LADISLÁU NETTO, p.57).

Outro diretor do Museu, João Batista de Lacerda, em 1905, ao apresentar as recordações históricas e científicas da instituição, referiu-se ao Laboratório Químico do Museu Imperial e Nacional:

“Por esse tempo, no andar de baixo do Museu foi instalado, de acordo com as solicitações de Caldeira, um laboratório para os estudos physicos e chimicos, provido de todos os arranjos necessários a investigações daquele gênero. Foi utliisando-se desses recursos práticos, que o Diretor do Museu poude ali realizar estudos sobre um combustível mineral e sobre o pau brazil”. (LACERDA, 1905, 13)

Em 1828, assumiu a gestão do Museu Imperial e Nacional e do Laboratório Químico, o frei carmelita Custódio Alves Serrão (1828-1847), formado na Universidade de Coimbra, lente de zoologia e botânica da Academia Real Militar, e autor da “Lições de chimica e mineralogia”. Neste período houve um crescimento do número e da variedade das análises realizadas pelo Laboratório.

De acordo com Nadja Paraense dos Santos, a Sociedade de Medicina do Rio de Janeiro teria solicitado autorização em 1831 para que seus membros pudessem utilizar os laboratórios e instrumentos disponíveis no Museu (SANTOS, 2004).

Por ordem do Imperador, em 1840, foram solicitados a Agostinho Rodrigues da Cunha os meios para preparar, no Laboratório Químico do Museu, as experiências para as exposições de química industrial, colaborando assim com a instrução científica popular (ANDRADE, 1949).  

Em 1847, Alves Serrão foi substituído por Frederico Leopoldo Cezar Burlamaque (1847-1866), formado em matemática pela Academia Real Militar e secretário perpétuo da Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional, que logo tratou de melhorar e enriquecer os recursos da entidade com a ajuda de Guilherme Schüch de Capanema,  (Barão de Capanema), que se tornou diretor-adjunto em 1849. Em função desta renovação dos recursos, foram efetuadas no Laboratório análises dos combustíveis naturais de diversas áreas, entre elas Tubarão, Herval, Fernando de Noronha e Lago Sacoré (sul da Bahia). 

O diretor Burlamaque empenhou-se na transferência do laboratório, da sala escura e mal arejada em que se encontrava, para um outro local mais adequado às análises e experiências ali realizadas (LADISLÁU NETTO, 1870, p.101).

Neste Laboratório Químico foram realizadas as primeiras perícias toxicológicas do país, isto porque o Laboratório era franqueado a toda e qualquer requisição por parte do Chefe de Polícia da Corte. Não só a Comissão Médica Policial da Corte, mas também o Chefe de Polícia de Niterói, fizeram uso dos recursos da instituição em 1856, para a perícia toxicológica de alguns órgãos, da qual participaram como peritos os médicos José Francisco de Sousa Lemos e Antônio José Pereira das Neves. Em outra ocasião, em 1861, chegaram ao Laboratório as vísceras do Cônego Antônio José Barbosa França, cuja morte gerou grande inquérito policial. Além de prestar a esses serviços, os aparelhos do Laboratório eram freqüentemente solicitados pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro e pela Academia Real Militar para o ensino da química e da física.   

Após período de relativo abandono na gestão de Francisco Freire Allemão de Cysneiros (1866-1874) no Museu Imperial e Nacional, o Laboratório teve novo e forte impulso com Ladislau de Souza Mello Netto (1874-1893), que convidou Theodor Peckolt para reorganizá-lo. A mudança consistiu na análise e reclassificação de todos os minerais de classificação duvidosa e também de qualquer substância desconhecida das outras seções do estabelecimento. A partir desse trabalho, Peckolt realizou inúmeras pesquisas fitoquímicas a respeito de nossa flora e publicou duas obras: “História das plantas alimentares e de gozo no Brasil” e “História das plantas medicinais e úteis do Brasil”, pelas quais recebeu de D. Pedro II o oficialato da Ordem da Rosa.
Somente em 1874, Ladislau de Souza Mello Netto, diretor interino do Museu Imperial e Nacional na época, entrou em contato com a Secretaria de Estado dos Negócios da Agricultura, Comércio e Obras Públicas para requisitar recursos para a reativação do Laboratório Químico do Museu. Em resposta, o diretor Ladislau recebeu deste órgão um comunicado cobrando o cumprimento da determinação do regulamento de 1842, que estabelecia a criação de cursos de ciências relativas às seções do Museu. 

O Museu Nacional sofreu nova remodelação em 1910, na administração de João Baptista de Lacerda (1895-1915), e “de esquecido no Ministério da Justiça, apesar de seus trabalhos e da importância de suas coleções, passou à evidência no Ministério da Agricultura, recém-criado, a que prestou enorme subsídio no organizar as suas múltiplas repartições técnicas” (ANDRADE, 1922, p.8). A partir do decreto no 7.862, de 9 de fevereiro de 1910, a sede do Museu, então situada no antigo Palácio Imperial da Quinta da Boa Vista, passou por grandes reformas de ampliação de suas instalações. O gabinete de Química teve sua capacidade duplicada, tendo sido criados dois novos laboratórios dessa matéria pelo decreto no 9.211, de 15 de dezembro de 1911, o “Laboratório de Química Analítica” e o “Laboratório de Química Vegetal”. Em 1916, quando Alfredo Antônio de Andrade foi nomeado chefe dos laboratórios de química, na gestão de Bruno Alvares da Silva Lobo (1915-1923), os dois laboratórios se fundiram no “Laboratório de Química”, conforme apresentou o decreto nº 11.896, de 14 de janeiro de 1916. 

Finalmente, em março de 1931, o Laboratório de Química deixou de ser uma seção autônoma da instituição que o abrigava, em decorrência da reforma realizada na gestão de Edgard Roquette-Pinto. 
 

Fontes

- ANDRADE, Alfredo de. História do Laboratório Químico do Museu.  Revista da Sociedade Brasileira de Química, Rio de Janeiro, v.XVIII, ns.1-4, jan./dez. 1949.  (BN)
- ANDRADE, Alfredo Antonio de. O Museu Nacional e a Difusão da Chimica. Rio de Janeiro: Typologia do Museu Nacional, 1922.   (MN)
- AZEVEDO, Fernando de (org). As Ciências no Brasil. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1994. v.2.             (BCOC)
- BRASIL. Decisão nº 206, de 15 de dezembro de 1824. In: Collecção das Decisões do Governo do Império do Brazil de 1824. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1886. p.189. In: CÂMARA DOS DEPUTADOS. Legislação. Capturado em 23 jul. 2020. Online. Disponível na Internet:            https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/legislacao/colecao-anual-de-leis/copy_of_colecao2.html
- BRASIL. Decreto nº 7.862, de 9 de fevereiro de 1910. In: SENADO FEDERAL. Portal Legislação.  Capturado em 23 jul.2020. Online. Disponível na Internet: http://legis.senado.leg.br/norma/591610/publicacao?tipoDocumento=DEC-n&tipoTexto=PUB
- BRASIL. Decreto nº 9.211, de 15 de dezembro de 1911. In: SENADO FEDERAL. Portal Legislação.  Capturado em 23 jul.2020. Online. Disponível na Internet: http://legis.senado.leg.br/norma/415674/publicacao?tipoDocumento=DEC-n&tipoTexto=PUB
- BRASIL. Decreto nº 11.896, de 14 de janeiro de 1916. In: SENADO FEDERAL. Portal Legislação.  Capturado em 23 jul.2020. Online. Disponível na Internet: http://legis.senado.leg.br/norma/422224/publicacao?tipoDocumento=DEC-n&tipoTexto=PUB
- CARRARA, Ernesto; MEIRELLES, Hélio. A indústria química e o desenvolvimento do Brasil (1500-1889). São Paulo: Metalivros, 1996.  (IHGB)
- LACERDA, J. B. de. Fastos do Museu Nacional do Rio de Janeiro. Recordações históricas e scientificas fundadas em documentos authenticos e informações verídicas. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1905. In: UFRJ. Museu Nacional. Capturado em 21 set. 2020. Online. Disponível na Internet: http://www.museunacional.ufrj.br/semear/docs/Livros/livro_LACERDA-JOAO.pdf
- LADISLÁU NETTO. Investigações históricas e scientificas sobre o Museu Imperial e Nacional do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Instituto Philomatico, 1870. In:  UFRJ. Repositório. Capturado em 21 set. 2020. Online. Disponível na Internet: https://bdor.sibi.ufrj.br/bitstream/doc/27/1/0055%20ocr.pdf
- SANTOS, Manoel Heleno Rodrigues dos. Aspectos históricos do ensino superior em Pernambuco e sua Escola de Química. Recife: [s. n.],1982.       (BN)
- SANTOS, Nadja Paraense dos. Os Primeiros Laboratórios Químicos do Rio de Janeiro. In: ENCONTRO REGIONAL DE HISTÓRIA, 11, 2004. Anais. Rio de Janeiro: ANPUH, 2004. Capturado em 23 jul. 2020. Online. Disponível na Internet: http://www.museunacional.ufrj.br/semear/docs/Apresentados_em_eventos/texto_SANTOS-NADJA.pdf

Ficha técnica

Pesquisa - Gil Baião Neto, Maria Rachel Fróes da Fonseca
Redação - Gil Baião Neto, Maria Rachel Fróes da Fonseca 
Revisão - Francisco José Chagas Madureira.
Atualização – Maria Rachel Fróes da Fonseca, Ana Carolina de Azevedo Guedes. 

Forma de citação

LABORATÓRIO QUÍMICO DO MUSEU IMPERIAL E NACIONAL. Dicionário Histórico-Biográfico das Ciências da Saúde no Brasil (1832-1970). Capturado em 21 nov.. 2024. Online. Disponível na internet https://dichistoriasaude.coc.fiocruz.br/dicionario


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